Os dias estão ficando mais quentes, a primavera se aproxima e, como de costume, ressurge a pauta do horário de verão — suspenso desde 2019, mas que insiste em voltar ao debate nacional. O Governo Federal ainda não bateu o martelo, mas o Operador Nacional do Sistema (ONS) incluiu a possibilidade em seu Plano de Operação Energética para 2025. A justificativa seria aliviar o consumo no horário de pico.
Mas a verdade é que o horário de verão é um remendo antiquado para uma realidade energética que já mudou. Se décadas atrás fazia algum sentido adiantar os relógios para economizar lâmpadas incandescentes, hoje o impacto é mínimo diante de um sistema elétrico que depende muito mais de ar-condicionado, geladeiras e eletrônicos ligados 24 horas por dia.
O argumento de que a medida preservaria reservatórios e reduziria o uso de usinas térmicas até soa bonito no papel. Mas especialistas reconhecem que, na prática, o efeito na conta de luz é quase imperceptível para o consumidor. E sejamos francos: quem sofre não é o setor elétrico, mas sim a população, obrigada a acordar mais cedo, enfrentar a escuridão da madrugada e ainda lidar com distúrbios de sono, fadiga e até riscos cardiovasculares comprovados em estudos.
Não à toa, a Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados já aprovou um projeto que proíbe a volta do horário de verão no país. O relator, deputado Diego Garcia (Republicanos-PR), foi direto: não compensa colocar milhões de brasileiros em um fuso horário artificial só para tapar um buraco de gestão no setor elétrico.
Enquanto isso, a conta de luz segue nas alturas. Em agosto, a bandeira tarifária vermelha no patamar 2 — a mais cara de todas — acrescentou quase R$ 8 a cada 100 kWh consumidos. Em vez de apostar em medidas ultrapassadas, o país precisa encarar o problema de frente: investir em geração limpa, armazenamento eficiente e tarifas mais justas.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá a palavra final. Mas é preciso lembrar: adiantar o relógio não adianta nada se o resultado for mais cansaço para a população e uma economia simbólica que não se reflete no bolso do brasileiro.
O que o país precisa não é de um fuso horário artificial, mas de um governo capaz de planejar sua matriz energética sem sacrificar o sono — e a saúde — de milhões.