O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa 35 anos neste mês de julho. Desde a sua criação, em 13 de julho de 1990, o Brasil avançou significativamente na proteção e promoção dos direitos de crianças e adolescentes, consolidando uma série de políticas públicas voltadas à garantia da dignidade, da educação, da saúde e da convivência familiar e comunitária.
Um dos principais marcos trazidos pelo ECA foi o reconhecimento de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos — civis, sociais, econômicos e políticos — e não mais como apenas objetos de tutela. Isso representou uma mudança profunda na forma como a infância é tratada no país.
Entre os avanços mais relevantes está a criação e a consolidação dos Conselhos Tutelares, órgãos permanentes e autônomos que atuam em todo o território nacional na fiscalização e proteção dos direitos de menores em situação de vulnerabilidade. Hoje, praticamente todos os municípios brasileiros contam com pelo menos um conselho tutelar em funcionamento.
Além disso, destaca-se o trabalho em rede, fundamental para a efetivação das políticas de proteção à infância. Esse trabalho envolve a atuação conjunta do Conselho Tutelar, escolas, Conselhos Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMCA), Ministério Público, Vara da Infância e Juventude e demais autoridades competentes. A articulação entre esses órgãos garante respostas mais eficazes e integradas às violações de direitos, fortalecendo a rede de apoio às famílias e comunidades.
Outro ponto fundamental é a conscientização das famílias e da população sobre seu papel no cuidado, proteção e formação de crianças e adolescentes. Para isso, são realizadas campanhas educativas, palestras, rodas de conversa e ações nas escolas, igrejas e associações comunitárias, com foco em temas como violência, disciplina positiva, educação e responsabilidade compartilhada. O uso de redes sociais, rádios comunitárias e material impresso também é estratégico para levar informação acessível à população. A divulgação de canais de denúncia como o Disque 100 e o fortalecimento do protagonismo juvenil também são ações importantes nesse processo.
A educação também registrou melhorias importantes nas últimas décadas. Com o apoio de políticas como o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), o Brasil ampliou o acesso ao ensino, reduziu os índices de evasão escolar e criou iniciativas como o Busca Ativa Escolar, que ajuda a identificar e reintegrar alunos ao sistema educacional.
No combate ao trabalho infantil, campanhas e políticas de fiscalização reduziram significativamente os índices de exploração. Pela legislação brasileira, o adolescente pode ingressar no mercado de trabalho a partir dos 14 anos, exclusivamente na condição de aprendiz, com jornada reduzida, atividades compatíveis com o seu desenvolvimento e garantia de escolarização. A partir dos 16 anos, o trabalho é permitido de forma mais ampla, mas ainda com restrições — como a proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre. O trabalho infantil, por sua vez, é proibido para menores de 14 anos e representa grave violação de direitos. Por isso, o enfrentamento à exploração do trabalho infantil continua sendo um desafio, especialmente em áreas rurais e em comunidades vulneráveis, exigindo atenção permanente dos órgãos da rede de proteção.
Outra conquista relevante é a criação do Disque 100, canal nacional de denúncias de violações de direitos humanos, e da Lei Menino Bernardo (conhecida como Lei da Palmada), que proíbe castigos físicos e tratamento cruel ou degradante como forma de educação.
A área da saúde também foi beneficiada por políticas específicas para a infância, como a ampliação do acesso a vacinas, atenção básica, aleitamento materno e o programa “Criança Feliz”, voltado ao desenvolvimento infantil nos primeiros anos de vida.
Além disso, houve importantes avanços nos processos de adoção com a criação do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA), que contribui para tornar os trâmites mais rápidos e transparentes, sempre priorizando o direito à convivência familiar.
Apesar dos avanços, especialistas alertam que o Brasil ainda enfrenta muitos desafios, como o combate à violência sexual, o acolhimento de crianças em situação de rua e a garantia de acesso à educação de qualidade em regiões mais vulneráveis.
Neste aniversário de 35 anos do ECA, o Brasil celebra conquistas, mas também reforça a necessidade de continuar lutando pela efetivação plena dos direitos de crianças e adolescentes, conforme estabelecido na Constituição Federal e no próprio Estatuto.
SAIBA MAIS: Como a rede atua na prática
Ao menor sinal de violação dos direitos da criança e do adolescente, a denúncia pode ser feita a qualquer membro da rede. A partir daí, cada órgão entra em ação, desempenhando uma função específica e complementar às demais, garantindo que a proteção seja completa e eficaz.
• Poder Judiciário (Vara da Infância e Juventude): Atua como garantidor dos direitos de crianças e adolescentes, decidindo sobre casos de risco, adoção, guarda, medidas protetivas e socioeducativas, com foco na proteção integral e na promoção da dignidade desse público.
• Ministério Público: Atua na defesa dos direitos e interesses. Instiga inquéritos, propõe ações civis e penais, fiscaliza entidades de atendimento e acompanha processos judiciais, seja como fiscal da lei ou como autor de ações de proteção e responsabilização.
• Conselho Tutelar: É o guardião dos direitos. Recebe denúncias, atende crianças, adolescentes e suas famílias em risco, aplica medidas protetivas e encaminha casos aos serviços competentes (saúde, assistência social, Ministério Público, Judiciário).
• Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente (Municipal, Estadual, Nacional): Formuladores de políticas públicas. Deliberam, fiscalizam e controlam as políticas de promoção e defesa dos direitos, além de gerenciar os recursos dos Fundos da Criança e Adolescente. Contam com composição paritária: governo e sociedade civil.
• Serviços de Saúde: Atendem, notificam casos de violência, maus-tratos, abuso ou exploração, e promovem a atenção integral à saúde física e mental.
• Escolas e Instituições de Ensino: Garantem o acesso, permanência e qualidade na educação. São essenciais na identificação de situações de risco e têm o dever de notificar o Conselho Tutelar em casos de evasão escolar, maus-tratos ou suspeita de violência.
• Assistência Social: Atende famílias em vulnerabilidade ou risco, oferecendo programas, serviços e benefícios que promovem proteção e fortalecimento de vínculos.
• Polícias Civil e Militar: Investigam crimes e infrações. A Polícia Civil apura os fatos, enquanto a Polícia Militar atua no policiamento ostensivo e preventivo. Ambas devem garantir atendimento especializado.