Guaratuba, como tantas cidades brasileiras, enfrenta uma crise social silenciosa, mas cada vez mais visível: o crescimento descontrolado da população em situação de rua. O que era um problema negligenciado há décadas agora se impõe como desafio urgente. E não é apenas no verão, quando a cidade recebe milhares de turistas e o fenômeno se intensifica com a migração sazonal. Basta circular pelas ruas neste inverno para perceber que o drama já se instalou — e que a omissão pode custar caro.
Sim, há muitos fatores por trás disso: desemprego, dependência química, saúde mental negligenciada, desagregação familiar. Mas um ponto exige atenção especial: a forma como benefícios sociais, como o Bolsa Família, estão sendo distribuídos. Há denúncias consistentes de que muitos desses recursos, liberados sem critérios rigorosos, têm sido desviados ou usados de maneira que não promove a reinserção social — há relatos de cartões de benefício nas mãos de traficantes. É urgente rever esses mecanismos, sob risco de alimentar o ciclo de miséria e violência.
Historicamente, Guaratuba falhou em enfrentar esse problema com a seriedade necessária. O que vimos foram ações esparsas, tentativas isoladas, discursos simpáticos — mas nada estrutural. O famoso “enxugar gelo ”. A cidade precisa romper com essa tradição da omissão disfarçada de empatia.
Mas não basta apenas vontade política da prefeitura. É essencial uma aliança institucional. Ministério Público e Judiciário devem compreender que cuidar da população de rua não é “limpar a cidade”, mas sim garantir direitos humanos. Não se trata de reprimir, mas de acolher, tratar e reinserir. A rua pode ser um ponto de passagem, nunca de permanência. Liberdade não é viver em papelão.
Exemplos não faltam. Cidades como Chapecó (SC) e Florianópolis adotaram políticas públicas firmes, baseadas na integração de serviços sociais, acolhimento, assistência médica e psicológica, programas de combate à dependência química e, sobretudo, oportunidades reais de reinserção no mercado de trabalho.
A nova administração tem em mãos uma oportunidade histórica de mostrar que é possível fazer diferente — e melhor. Guaratuba pode inovar. Pode fazer história. Mas só se entender que dignidade não se terceiriza — se constrói com decisão e humanidade.
Por Cleomar Diesel