A troca de secretários de Saúde em Guaratuba, mais uma vez anunciada nesta semana, levanta uma questão que vai além da política local. O problema da instabilidade na gestão não é exclusividade do município litorâneo: ele se repete em diversas cidades do país e ajuda a compor um cenário conhecido da saúde pública brasileira, marcado por dificuldades de financiamento, falta de profissionais e pressão política.
Um levantamento nacional aponta os principais entraves enfrentados pelos municípios na gestão do Sistema Único de Saúde (SUS). O subfinanciamento crônico — com repasses insuficientes e irregulares — compromete o planejamento de médio e longo prazo. Some-se a isso a dificuldade em contratar e manter médicos, enfermeiros e equipes da Atenção Primária, a carência de infraestrutura adequada, a falta de medicamentos e a crescente judicialização que impõe gastos imprevistos.
No dia a dia da população, esses problemas se traduzem em longas filas para consultas e exames, dificuldade de acesso a especialidades e queixas sobre o atendimento. É o ponto em que o cidadão sente na pele as limitações de um sistema que, apesar de universal e gratuito, convive com gargalos estruturais há décadas.
Em Guaratuba, a prefeitura aplica na saúde mais do que o percentual mínimo exigido por lei. Mesmo assim, reclamações continuam a surgir, e com razão: a demanda é crescente, e os recursos, limitados. Esse paradoxo revela o dilema vivido por inúmeros municípios brasileiros, que gastam mais do que a obrigação legal, mas ainda assim não conseguem dar conta de todas as necessidades da população.
Há, contudo, outro componente que complica ainda mais a equação: a política. A troca constante de gestores enfraquece a continuidade de projetos e políticas públicas. E, no jogo entre situação e oposição, não raramente prevalece a lógica do “quanto pior, melhor”. Quando no governo, a crítica é contida; quando na oposição, ela é multiplicada — sem que as dificuldades estruturais mudem de fato.
Especialistas apontam alguns caminhos possíveis, ainda que limitados pelo orçamento: fortalecer a Atenção Primária como porta de entrada mais resolutiva, ampliar consórcios regionais de saúde para compartilhar custos, adotar ferramentas digitais para gestão de medicamentos e melhorar a comunicação com os usuários.
A verdade é que nenhum município, sozinho, conseguirá resolver o subfinanciamento histórico do SUS. Mas a gestão local tem papel decisivo em reduzir os impactos e buscar soluções criativas. No caso de Guaratuba, a sequência de trocas de secretários expõe não apenas a instabilidade administrativa, mas um retrato fiel do desafio nacional: administrar a saúde pública em meio à escassez de recursos, às altas expectativas da população e às disputas políticas que frequentemente obscurecem o debate técnico.
Por Cleomar Diesel